” O ranger dos dentes” – Por Gustavo Krause

” O ranger dos dentes” – Por Gustavo Krause

Neste momento compartilho com os leitores do Blog Ponto de Vista um excelente artigo que li de autoria do ex-governador Gustavo Krause, que foi publicado na seção de OPINIÕES do Jornal do Comércio de ontem (09). No artigo, Krause faz uma pequena análise sobre o processo eleitoral que vivenciamos recentemente. Boa leitura!   “O ranger dos dentes A urna fala. Tem boca e língua. A urna tem dentes. Esta foi a grande descoberta das eleições municipais de 2016. Além do silêncio, mensagens e lições, ouviu-se o ranger de dentes das urnas. Este ranger de dentes não se confunde com o bruxismo, patologia decorrente da compressão (oclusão) dentária com graves consequências para a saúde dos pacientes. Não se confunde, também, com a descrição bíblica do inferno, onde os condenados padecem de aflição, sofrimento, dores e haverá “pranto e ranger de dentes”. Mas, convenhamos, as urnas de 2016 não revelaram, apenas, a enorme descrença com os políticos, um fenômeno mundial, e o recado do silêncio, da apatia, da insatisfação e da indiferença; emitiram o som do ranger de dentes da raiva, da ira que alimentam a mais grave crise de representatividade vivida pelo Brasil. Neste sentido, basta mencionar um dado: os 25 milhões de eleitores que se abstiveram de votar, somados aos votos brancos e nulos “venceram” a eleição em 22 capitais. A democracia representativa está gravemente enferma. O sistema político – o partidário e o eleitoral – clamam, dramaticamente, por reformas que tardam e, a meu ver, óbvias: cláusula de barreira, sistema distrital misto, financiamento público das campanhas. A propósito, o que ocorreu nestas eleições foi um “experimento social”, tendo como cobaias mais de 144 milhões de eleitores. Um desrespeito à cidadania e uma afronta à inteligência: redução do tempo de campanha proibição de financiamento de empresas, portas escancaradas para um jogo que estimula o “jeitinho” brasileiro e reforça o desequilíbrio de forças entre os concorrentes. O pleito ratificou duas graves distorções: a fragmentação partidária e a ampliação do espaço para os aventureiros que, cinicamente, se transvestem do aintipolítico, sabendo que ocupará cargos públicos cujas responsabilidades exigem mais do que atributos gerenciais; exigem dos eleitos virtudes republicanas de um líder capaz de operar transformações sociais. Entretanto, cabe ressaltar dois efeitos positivos: o barateamento das campanhas e a prevalência propositiva frente ao truque ilusionista das promessas falaciosas, o que pode ser aperfeiçoado pela ênfase no debate público. Em paralelo, não se pode perder de vista a profilaxia ética promovida pela Lava Jato, que se completa com a institucionalização das medidas anticorrupção, de modo que, em 2018, o eleitor não caia no conto dos salvadores da pátria.” Gustavo Krause - Ex-Governador de Pernambuco Fonte: Jornal do Comércio - Opiniões - pág. 18 - Edição de 09/10/2016

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Neste momento compartilho com os leitores do Blog Ponto de Vista um excelente artigo que li de autoria do ex-governador Gustavo Krause, que foi publicado na seção de OPINIÕES do Jornal do Comércio de ontem (09). No artigo, Krause faz uma pequena análise sobre o processo eleitoral que vivenciamos recentemente. Boa leitura!

 

O ranger dos dentes

A urna fala. Tem boca e língua. A urna tem dentes. Esta foi a grande descoberta das eleições municipais de 2016. Além do silêncio, mensagens e lições, ouviu-se o ranger de dentes das urnas.

Este ranger de dentes não se confunde com o bruxismo, patologia decorrente da compressão (oclusão) dentária com graves consequências para a saúde dos pacientes. Não se confunde, também, com a descrição bíblica do inferno, onde os condenados padecem de aflição, sofrimento, dores e haverá “pranto e ranger de dentes”.

Mas, convenhamos, as urnas de 2016 não revelaram, apenas, a enorme descrença com os políticos, um fenômeno mundial, e o recado do silêncio, da apatia, da insatisfação e da indiferença; emitiram o som do ranger de dentes da raiva, da ira que alimentam a mais grave crise de representatividade vivida pelo Brasil. Neste sentido, basta mencionar um dado: os 25 milhões de eleitores que se abstiveram de votar, somados aos votos brancos e nulos “venceram” a eleição em 22 capitais.

A democracia representativa está gravemente enferma. O sistema político – o partidário e o eleitoral – clamam, dramaticamente, por reformas que tardam e, a meu ver, óbvias: cláusula de barreira, sistema distrital misto, financiamento público das campanhas.

A propósito, o que ocorreu nestas eleições foi um “experimento social”, tendo como cobaias mais de 144 milhões de eleitores. Um desrespeito à cidadania e uma afronta à inteligência: redução do tempo de campanha proibição de financiamento de empresas, portas escancaradas para um jogo que estimula o “jeitinho” brasileiro e reforça o desequilíbrio de forças entre os concorrentes.

O pleito ratificou duas graves distorções: a fragmentação partidária e a ampliação do espaço para os aventureiros que, cinicamente, se transvestem do aintipolítico, sabendo que ocupará cargos públicos cujas responsabilidades exigem mais do que atributos gerenciais; exigem dos eleitos virtudes republicanas de um líder capaz de operar transformações sociais.

Entretanto, cabe ressaltar dois efeitos positivos: o barateamento das campanhas e a prevalência propositiva frente ao truque ilusionista das promessas falaciosas, o que pode ser aperfeiçoado pela ênfase no debate público.

Em paralelo, não se pode perder de vista a profilaxia ética promovida pela Lava Jato, que se completa com a institucionalização das medidas anticorrupção, de modo que, em 2018, o eleitor não caia no conto dos salvadores da pátria.”

Gustavo Krause – Ex-Governador de Pernambuco

Fonte: Jornal do Comércio – Opiniões – pág. 18 – Edição de 09/10/2016

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